quinta-feira, 5 de março de 2009

Especial: 100 anos de Patativa do Assaré - A Festa

100 anos de Patativa do Assaré

Patativa do Assaré completaria hoje 100 anos. Nesse século de vida, criou, inovou, encantou o povo simples do Sertão e os intelectuais. Ajudou a levar mais cultura para o Interior do Ceará e um pouco desta cultura para o Brasil e o mundo, onde foi lido, estudado em universidades e escutado em poemas musicados por cantores consagrados. Na lida simples do roçado fez seus versos que falavam da natureza, da justiça social e da terra, que deixaram sua marca na vida e na alma do cearense.

Foto: O Povo

Assaré, a terra que canta seu poeta

Centenário de Patativa movimenta Assaré, que prepara homenagens
Antônio Gonçalves da Silva viveu a maior parte de seus 93 anos em Assaré. Lá nasceu e morreu, tendo saído da cidade apenas por curtas temporadas. A maioria delas motivada pelo desejo de divulgar sua arte. Poeta maior entre o panteão popular, Patativa do Assaré colocou a pequena cidade do Cariri no mapa da cultura nacional. Assaré respira seu filho ilustre e, às vésperas de seu centenário, se prepara para celebrá-lo. Desde o primeiro dia do mês, a cidade está em festa. É a quinta edição de Patativa do Assaré em Arte e Cultura, evento anual que já entrou para o calendário de festas do município (confira programação ao lado).

As casas do poeta

O dia também será marcado por ações voltadas à preservação da memória de Patativa do Assaré. O secretário de Cultura do Município, Marcos Salmo, confirmou a reinauguração da casa em que nasceu o poeta Patativa do Assaré, na Serra de Santana. O casarão de taipa, contando com 16 cômodos, foi restaurado pela Prefeitura com o apoio da equipe de patrimônio da Secretaria da Cultura do Estado. O orçamento da ficou em torno de R$ 60 mil.

De acordo com a Secretaria de Cultura de Assaré, a idéia é transformar o local em um Museu do Agricultor. Ainda não há data precisa para que o projeto seja executado, mas a proposta é que seja administrado pela Fundação Memorial Patativa do Assaré. A fundação, dirigida pela neta de Patativa, Isabel Cristina Gonçalves, é a responsável pela casa dedicada ao artista. O Memorial Patativa do Assaré se localiza na Praça da Igreja Matriz, em um casarão do século XVIII, que abriga uma exposição permanente sobre a sua vida e obra. Fotografias e retratos do poeta produzidos por artistas diversos em diferentes técnicas, objetos pessoais, livros, LPs, CDs e vídeos: o acervo cobre toda a produção de Patativa e deixa entrever a intimidade do homem.

Este material fica no primeiro andar da construção que possui três pisos. No segundo, o espaço é reservado para outras exposições; e o terceiro abriga uma biblioteca de cordéis e a parte administrativa do memorial. O local ainda dispõe de um auditório, com 70 lugares. Na programação do evento, em homenagem ao poeta, está confirmada a assinatura da Ordem de Serviço de reforma do Memorial Patativa do Assaré, pelo secretário da Cultura Auto Filho. A obra prevê a ampliação do auditório e reparos na estrutura do prédio e em sua instalação elétrica.

Obra rende frutos à família

A fama de Patativa do Assaré nunca foi compatível com as suas posses. O poeta trabalhou na roça, até metade da década de 1970, e da terra tirava o sustento da família. Sem constituir uma fortuna financeira, a obra que deixou, hoje, ajuda os filhos que teve com dona Belinha.

A inventariante da obra é a neta Isabel Cristina, 32 anos, filha de Lúcia Gonçalves. É ela a responsável por tratar da liberação da obra para publicações e gravações. “Temos contratos com várias editoras. Algumas pagam os direitos da obra trimestralmente, outras, por semestre. Atualmente, a obra de vovô é publicada pelas editoras Hedra, Vozes, Global e Escrituras”, conta Isabel. O dinheiro que recebe é repassado em sete partes iguais, correspondentes ao número de filhos vivos que Patativa do Assaré tinha até o momento de sua morte.

Isabel conta que a obra do avô nunca rendeu uma grande quantia em dinheiro para a família. “Dava pra ganhar dinheiro com as poesias que ele fazia, mas vovô nunca foi de tá cobrando os outros, de tá explorando. Não digo que ele ganhava. O que vinha, ajudava a família, mas ele poderia ter ganhado muito mais” avalia. Hoje, a administração da obra é bem planejada. “Temos algumas poesias inéditas (ver pag.9) e temos interesse em publicá-las. Mas, acho que este não é o momento”.

Sobrinho é único herdeiro lírico

A herança de Patativa do Assaré para a família reside na formação moral (rígida) que deu aos filhos e as propriedades material e intelectuais. A arte de versejar não foi passada para seus descendentes. “Dos filhos que papai teve, ninguém aprendeu a fazer verso. A gente só fazia, às vezes, uma quadrinha”, assegura Inês Cidrão, filha de Patativa.

Entre os Gonçalves, Patativa teve, como herdeiro de sua arte, o sobrinho Geraldo Alencar, 63 anos. Não que Geraldo tenha aprendido a fazer versos com o tio. Seu primo, o filho de Patativa que também se chama Geraldo, é quem explica: “isso não é coisa que se aprenda não. A pessoa já nasce com aquela coisa de fazer poesia”. Geraldo, o poeta, concorda, mas não esconde a dívida com o tio. “Eu escrevia sonetos e ele dizia que ´tava fora da métrica”.

Geraldo é filho de um primo de Patativa. Como o tio, nasceu, se criou e viveu a maior parte da vida na Serra de Santana. Foi lá, também, que começou a fazer versos, aos 14 anos. “Ele era muito carrasco. Gostava de dizer a verdade e era muito pontual. Eu mostrava e ele dizia que não prestava. Até que um dia, eu escrevi um poema intitulado ‘Pergunta de Morador’. Aí ele ficou calado. Depois de uns dias, me perguntou: ‘Geraldo, você me dá a permissão de fazer a resposta pr’aquele verso seu’”, lembra.

Daí nasceu a parceria que rendeu três volumes da antologia “Balseiro”. Inês lembra das composições. Quando Patativa subia a serra, sempre procurava o sobrinho. “Inês, vá ali chamar Geraldo, pra gente passar a tarde brincando. Um sentava numa testeira da mesa e o outro, na ponta. Ele fazia um poema na mente e Geraldo fazia o dele escrevendo”, conta.

DELLANO RIOS
Repórter

fonte: DN

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